Café & Tapioca

O dilema do esclarescimento — Kant & Sociedade dos Poetas Mortos

Você se sente medíocre? Eu também!

Eu constantemente me sinto medíocre, seja pela minha incapacidade as vezes de aprender algum tópico, ou por sentir que meu conhecimento é em sua totalidade raso - e creio que a maioria dos universitários se sentem assim também. Isso em certo nível é bom e saudável, o estudante precisa ter brio, você precisa abaixar seu ego. Aquele que por algum motivo acha que sabe de tudo, não sabe praticamente nada sobre a totalidade daquilo que estuda, porém precisamos ser justos com o “eu”.

Kant, e o “Esclarescimento”

Kant tem um texto chamado: “Resposta à questão: O que é Esclarescimento?”. Esse texto fala sobre como o esclarescimento como a resposta para a saída do homem de sua mediocridade. Acho um ótimo texto para ler em momentos de “baixa auto estima intelectual”, sempre saio me sentindo mais confiante para aprender, mesmo sendo burro, pois o único caminho para sair da mediocridade é o de aprender a trilhar o seu próprio diante da vastidão do conhecimento.

Tal tutela é auto-imposta quando sua causa não reside em falta de razão, mas de determinação e coragem para usá-lo sem a direção de outro. Sapere Aude! Tenha coragem de usar sua própria mente (Verstandes)! Este é o lema do Esclarecimento. (…) É tão cômodo ser imaturo.

Kant disserta sobre a comodidade da imaturidade, principalmente a imaturidade do conhecimento e da vontade de saber, e conhecer. Ao viver em uma sociedade pautada pelo lucro, o caminho do menor esforço tende a sempre ser o “melhor” caminho, mas essa quase nunca é a verdade. Vivemos para o trabalho, até tal ponto que se torna exaustivo estar incessantemente á procura de respostas diante de uma sede de conhecimento.

A preguiça e a covardia são as causas pelas quais uma tão grande parte dos homens, depois que a Natureza de há muito os liberou de uma direção alheia (naturaliter maiorennes), continuem no entanto de bom grado tutelados durante toda a vida. São também as causas que explicam por que é tão fácil que os outros se constituam em seus tutores. É tão cômodo ser imaturo. Se tenho um livro que faz as vezes de meu entendimento, um pastor que tem consciência por mim, um médico que decide a respeito de minha dieta etc., então não preciso nem tentar. Não tenho necessidade de pensar, quando posso simplesmente pagar; outros se encarregarão em meu lugar do trabalho cansativo.

Apesar de grande parte disso não ser 100% aplicável em um contexto moderno — especialmente as críticas que acusam os “tutelados” de serem covardes e preguiçosos —, é preciso dar crédito a ele por dizer aquilo que muitos de nós têm medo de admitir para si mesmos. Sim, eu sou medíocre, eu sou preguiçoso e eu sou covarde - eu não falo por você, eu falo por mim -.

Por que é tão difícil se desvencilhar da mediocridade?

É muito difícil desvencilhar-se, cada homem, dessa imaturidade tornada natural. Afeiçoou-se à brida e é realmente incapaz de usar a própria mente, vez que nunca teve de tentar fazê-lo. Regras e fórmulas, esses instrumentos mecânicos do emprego racional, ou melhor, mau uso, de seus dons naturais, são os grilhões de uma tutela eterna. Quem delas se livrou só conseguiria dar um salto inseguro, mesmo sobre o mais estreito fosso, porque falto de hábito de circular livremente. Portanto, são poucos os que conseguiram, pelo cultivo de suas próprias mentes se livrarem de imaturidade e obter um caminhar seguro.

Essa é uma ótima discussão para se fazer: “Por que é tão difícil se desvencilhar da mediocridade?”.

Desde cedo somos ensinados que o estudo é uma forma para ascender socialmente dentro da sociedade capitalista - o que é irônico, visto que a profissão de professor é uma das mais sucateadas do país. Apesar de estudarmos, estudamos apenas pelo fator utilitarista que o conhecimento proporciona, estudamos com a única finalidade de fazer uma prova - e de nenhuma maneira estou falando que isso é ruim, porém estou apenas levantando a discussão de que raramente estudamos algo porque gostamos, pois raramente temos tempo para isso. Estamos constantemente preocupados com concursos, vestibulares, provas sem pé nem cabeça; então a decoreba acaba sendo o único caminho possível-. O fator singularmente utilitarista do conhecimento acaba apagando em alguns momentos a beleza que existe inerentemente atrelada á ele; isto é uma opinião pessoal minha: enxergar o conhecimento como algo belo, bonito, que precisa ser desconstruído e entendido em sua essência, quando possível, me faz ter uma ânsia incontrolável por querer aprender cada vez mais.

Um filme que representa bastante esse sentimento é “Sociedade dos Poetas Mortos”, o saber pelo saber, eu não quero aprender para me tornar alguém lúdico, eu quero aprender pois sou parte da raça humana, e eu sou apaixonado por aprender sobre aquilo que amo - você por estender isso para relações humanas também.

“We don’t read and write poetry because it’s cute. We read and write poetry because we are members of the human race. And the human race is filled with passion.”

“When you read, don’t just consider what the author thinks, consider what you think”

Concluindo o meu ponto: se torna difícil se desvencilhar da mediocridade justamente pela dinâmica de aprendizado que é atribuída dentro da sociedade capitalista. O conhecimento não é algo para ser apaixonado, o conhecimento é algo para gerar lucro, e nada mais.

O primeiro passo para fora da mediocridade

Você precisa ter brio. O brio é a essência para sair desse sentimento horrível que é a mediocridade, tudo bem ser medíocre, mas conscientemente se manter nessa posição é cometer um crime contra si mesmo - tenha amor próprio -.

Brio é fazer o seu melhor, mesmo que ninguém esteja olhando, não por uma vaidade idiota, mas sim por respeito a si mesmo. Se alguém escreveu aquilo, eu só preciso ser capaz de entender o que fora escrito, não é possível que eu não seja capaz disso, certo?

Atualmente me encontro querendo conhecer muito sobre os fundamentos do que estudo, porém eu literalmente não tenho tempo para isso, e se tenho prefiro não passar 100% do meu tempo estudando, não quero me dar ao luxo de ter o meu segundo burnout. Respeitar os seus limites é importante também.

Estou tentando aumentar meu tempo ativo de estudo, pois sinto que eu posso fazer melhor do que faço atualmente, e eu vou, pois eu sei que sou capaz e só preciso me puxar um pouquinho a mais para fora da minha mediocridade. Por mais que o capitalismo estimule a mediocridade, ser medíocre não vai me levar longe na vida, a não ser que eu seja um herdeiro - (in)felizmente.

#Instrospecção